Viver pelo bem que existe no mundo!

Na verdade nem deveríamos estar aqui, mas estamos. São como nas grandes histórias. As que tinham mesmo importância. Eram repletas de escuridão e perigo. E às vezes, você não queria saber o fim.... Porque como podiam ter um final feliz? Como podia o mundo voltar a ser o que era depois de tudo isso? Mas, no fim, é só uma coisa passageira, que logo se transformará. Um novo dia virá. E quando o sol brilhar, brilhará ainda mais forte. Eram essas as histórias que ficavam nas lembranças, que significavam algo. Mesmo que você fosse pequeno demais para entender o por quê. Mas acho, que entendo, sim. Agora eu sei. As pessoas dessas histórias tinham várias oportunidades de voltar atrás mas não voltavam. Elas seguiam em frente, porque tinham no que se agarrar. - E nós, no que devemos nos agarrar? No bem que existe nesse mundo, pelo qual vale a pena lutar. Senhor dos Anéis.

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

O CRIME E O CASTIGO

Então, um dos juízes da cidade acercou-se e disse: “Fala-nos do crime e do castigo.
E ele respondeu, dizendo:
“É quando vosso espírito vagueia sobre o vento que vós, sozinhos e desprevenidos, cometeis
delitos contra os outros e, portanto, contra vós mesmos.
E para redimir-vos do mal cometido, devereis bater à porta dos eleitos e esperar algum tempo
antes de serdes atendidos.
Similar ao oceano é vosso Eu-divino: permanece sempre imaculado.
E, como o éter, ele sustenta somente os alados.
E similar também ao sol é vosso Eu-divino: desconhece os caminhos das tocas e evita o covil
das serpentes.
Mas vosso Eu-divino não habita sozinho o vosso ser.
Em vós, muitoé ainda do homem, e muito não é ainda do homem, mas apenas de um pigmeu
informe que vagueia sonâmbulo nas brumas à procura de seu próprio despertar.
É do homem em vós que quero agora falar: porque é ele, e não o vosso Eu-divino ou o
pigmeu que vagueia nas brumas, quem conhece o crime e o castigo do crime.
Freqüentemente, tenho-vos ouvido falar daquele que comete uma ação má como se não fosse
dos vossos, mas um estranho entre vós e um intruso em vosso mundo.Mas eu vos digo: da mesma maneira que o santo e o justo não podem elevar-se acima do que
há de mais elevado em vós, assim o perverso e o fraco não podem descer abaixo do que há de mais
baixo em vós.
E da mesma forma que nenhuma folha amarelece senão com o silencioso assentimento da
árvore inteira, assim o malfeitor não pode praticar seus delitos sem a secreta concordância de todos
vós.Como uma procissão, vós avançais, juntos, para vosso Eu-divino.
Vós sois o caminho e os que caminham.
E quando um dentre vós tropeça, ele cai pelos que caminham atrás dele, alertando-os contra a
pedra traiçoeira.
Sim, e ele cai pelos que caminham adiante dele, que, embora tenham o pé mais ligeiro e mais
seguro, não removeram a pedra traiçoeira.
E ouvi também isto, embora a palavra pese rudemente sobre vossos corações: o assassinato é
censurável por seu próprio assassínio.
E o roubado não está isento de culpa por ter sido roubado.
E o justo não é inocente das ações no iníquo.
Sim, o agressor é, muitas vezes, a vítima do agredido.
E mais comumente ainda, o condenado carrega o fardo para o inocente e o irreprochável.
Vós não podeis separar o justo do injusto e o bom do malvado, porque ambos caminham
juntos diante da face do sol, exatamente como os fios branco e negro são tecidos juntos.
E quando o fio negro se rompe, o tecelão verifica todo o tecido e examina também o tear.
Se um dentre vós põe em julgamento a esposa infiel, que pese também na balança o coração
de seu marido e lhe meça a alma com cuidado.
E aquele que deseja fustigar o ofensor, que examine a alma do ofendido.
E se um dentre vós pretende punir em nome da retidão e derrubar a árvore do mal, que
observe as raízes da árvore; e, na verdade, verá as raízes do bem e do mal, do frutífero e do estéril,
entrelaçadas no coração silencioso da terra.
E vós, juízes que desejais ser justos, que julgamento pronunciareis contra aquele que, embora
honesto na carne, é ladrão no espírito?
E como punireis aquele que assassina o corpo, mas é, ele próprio, assissanado no espírito?
E como processareis aquele que, impostor e opressor nas suas ações, é também molestado e
ultrajado?
E como punireis aqueles cujos remorsos já são maiores que seus delitos?
Não é o remorso uma justiça aplicada por esta mesma lei que desejais servir?
E, contudo, não podeis impor o remorso ao coração do inocente, nem retirá-lo do coração do
culpado.
Espontaneamente, ele gritará na noite para que os homens despertem e reconsiderem.
E vós que desejais compreender a justiça, como a compreendereis sem examinar todas as
ações na plenitude da luz?
Somente então sabereis que o ereto e o caído são um mesmo homem, vagueando no
crepúsculo entre a noite de seu Eu-pigmeu e o dia de seu Eu-divino, e que a pedra angular do
templo não supera a pedra mais baixa de suas fundações.”

O Profeta. Gibran Khalil Gibran